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11 de fev. de 2011

Entrevista de Tarso Genro

O governador do Rio Grande do Sul e ex-ministro da Justiça, Tarso Genro, ataca as decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) no caso do italiano Cesare Battisti. No Ministério em 2009, Genro concedeu refúgio a Battisti e afirma que o STF age de forma ilegal ao decidir por mantê-lo preso.

- O Supremo está errado, está violando a Constituição e já deveria ter mandado soltar o Battisti, que está ilegalmente preso no País há muito tempo - critica em entrevista a Terra Magazine.

É aguardada para este fevereiro a decisão final do STF sobre a extradição de Battisti. Nesta quarta-feira (9), o Senado aprovou a indicação do ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Luiz Fux, para integrar o Supremo. O julgamento sobre Battisti deve acontecer depois que o novo ministro tomar posse.

"Eu não sei o que esperar porque o STF já violou a lei em diversas oportunidades", diz com dureza o governador gaúcho. "Violou a lei quando não interrompeu o processo de extradição mesmo que a legislação - claríssima - diga que quando é concedido refúgio, a extradição deve ser interrompida".

Ex-membro do Proletários Armados pelo Comunismo (PAC), Battisti é considerado terrorista pelo governo italiano e foi condenado à prisão perpétua por quatro assassinatos ocorridos na década de 1970. Depois de exilar-se na França por mais de 10 anos, ele fugiu para o Brasil assim que o governo francês decidiu pela extradição para a Itália, em 2004.

Depois da decisão de Genro, o STF entendeu que era preciso colher a posição do presidente Lula. O motivo foi estar em jogo questão de relação internacional entre dois países. Ao fim do mandato, Lula acatou parecer da Advocacia Geral da União (AGU) que recomendava a manutenção de Battisti em território brasileiro e também decidiu pela não extradição. O STF decidirá agora se a decisão de Lula contrariou ou não tratado bilateral entre Brasil e Itália.

Genro comenta, ainda, a situação financeira do Rio Grande do Sul, que considera crítica. Balanços desde o ano de 2006 disponíveis na Secretaria da Fazenda do Estado apontam que nos últimos quatro anos o Rio Grande do Sul arrecadou menos do que previa em orçamento e Genro avalia que o problema de saúde financeira segue há pelo menos dez anos. Em 2010, o saldo em caixa deixado para o ano seguinte era de apenas R$ 748,07. De volta de uma viagem ao Uruguai nesta semana, o governador prega ainda a necessidade de regionalizar as relações com os países do Sul.

Leia a entrevista na íntegra.

Terra Magazine - O senhor esteve esta semana no Uruguai para falar de Mercosul, o que tirou dessa viagem?

Tarso Genro - Nós temos uma contiguidade territorial com o Uruguai, temos também uma afinidade produtiva e cultural. Todas as questões importantes que relacionam o Uruguai com o nosso País passam ou politicamente ou fisicamente com o nosso território. Então foi uma aproximação, buscando uma agenda de trabalho do Estado com o Uruguai. Seja na relação entre empresários, com eventos culturais ou na discussão da questão do arroz. Temos uma saturação da produção na região e temos que buscar em conjunto terceiros mercados.

E por que esse aspecto regional é importante?

É uma estratégia de aproximação e de construção de uma agenda bilateral que impulsione a integração do Mercosul. Nós não podemos ter o Mercosul apenas como um corredor para os interesses de São Paulo e Buenos Aires. Temos que fazer integrações regionais fortes. Temos a ambição de transformar o Rio Grande do Sul em uma base institucional política, uma base de relacionamento. E preciso que essa região do Cone Sul seja também um palco privilegiado de negociação política e não meramente comercial.

Quando assumiu, o senhor criticou a ex-governadora Yeda Crusius (PSDB) e declarou que o caixa do Estado estava zerado. Como está a situação agora?

Nossa situação financeira aqui não foi uma surpresa. Nós sabíamos que a situação do Estado era muito ruim e que isso apenas dava continuação a uma situação dramática que se arrasta há mais de 20 anos. Quando nós anunciamos a situação que a governadora Yeda deixava, nós apenas impugnamos a visão de que ela tinha supostamente melhorado a situação financeira do Estado e conseguido um equilíbrio fiscal. Nós sabíamos que isso não era verdadeiro, que era apenas um trabalho de marketing. Partia do pressuposto de que meramente não gastar em saúde, não gastar em educação e nem em segurança colocaria o Estado numa situação virtuosa. Herdamos uma situação de caixa ruim, herdamos muitas dívidas e um potencial de arrecadação que não indica qualquer melhora. Mas estamos preparados para enfrentar essa situação.

Qual a extensão real do problema e qual a estratégia para contornar?

Temos que agilizar o nosso controle, nossa fiscalização, imprimir um ritmo acelerado no sistema de cobranças e vamos procurar a melhoria de caixa criando condições para o crescimento econômico da região. Nós queremos resolver o problema de caixa crescendo. E não deixando de gastar. Vamos gastar com equilíbrio, mas vamos fazer todos os movimentos para o Rio Grande do Sul ter uma taxa de crescimento superior, inclusive, à do Brasil. Temos hoje 17% da renda líquida do Estado comprometida com o pagamento e a rolagem da dívida pública. É uma situação adversa, mas não é insuperável. O ex-presidente Lula enfrentou uma situação bastante parecida na União.

O STF decide esse mês sobre a extradição de Cesare Battisti. O que o senhor espera dessa decisão?

Eu não sei o que esperar porque o STF já violou a lei em diversas oportunidades. Violou a lei quando não interrompeu o processo de extradição mesmo que a legislação - claríssima - diga que quando é concedido refúgio, a extradição deve ser interrompida. Violou a lei quando não respeitou a decisão do presidente da República - soberana e deferida pela Constituição - de que a palavra final sobre o assunto é do próprio Supremo. Violou a lei alterando sua tradição de interpretação da lei, porque o Supremo já havia decidido no sentido contrário em outros casos, inclusive de pessoas integrantes da Brigada Vermelha. Como o Supremo decide a interpretação da lei em última instância, nós, dentro da democracia, temos que acatar. Não podemos, evidentemente, considerar que estas decisões são constitucionais. O Supremo está errado, está violando a Constituição e já deveria ter mandado soltar o Battisti, que está ilegalmente preso no País há muito tempo.

E o que o senhor achou da carta em que Battisti se defendia e que o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) leu em plenário?

Eu não devo mais me manifestar sobre isso porque não sou mais ministro da Justiça. Já cumpri o meu dever, meu despacho está plenamente fundamentado e teve o apoio dos juristas mais ilustres do nosso País. Isso foi pouco comentado na mídia, mas dezenas de juristas se manifestaram favoráveis ao meu despacho. E eu apenas repeti os argumentos que eu já tinha dado sobre o assunto, mas a partir de agora não falo mais sobre o assunto porque é da competência do ministro (José Eduardo) Cardozo.

Gostaria de fazer uma menção a uma entrevista que o senhor deu ao jornal italiano La Stampa, no qual compara o Battisti aos militantes brasileiros do período da Ditadura Militar. É uma comparação controversa, porque no meio jurídico mesmo há quem diga que Battisti não pode ser colocado no patamar de um perseguido político.

Eu acho que isso é uma bobagem. O governo italiano - que é um governo que nós conhecemos muito bem pelas informações que circulam no plano internacional - chamou o Battisti de terrorista. O que eu disse e repito é que isso não basta para qualificar uma pessoa como terrorista, porque nós, na época do regime militar, também éramos chamados pela ditadura de terroristas.

O senhor não acha controverso que alguém acusado de cometer tantos crimes tenha acesso aos políticos e proteção da lei brasileira?

Não se trata de proteção da lei brasileira, trata-se de proteção do direito internacional. E esses supostos crimes que o Battisti cometeu não estão provados. Qualquer juiz que examinasse esse processo nos dias de hoje, iria inocentá-lo. O problema é que se formou na mídia essa ideia de que estão provados os crimes que ele cometeu. E não estão provados. São processos absolutamente irregulares. Alguns deles, inclusive, questionados pela Anistia Internacional por conta dos métodos utilizados para obter determinadas provas.

Ana Cláudia Barros e Dayanne Sousa

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